Assim que Marco Segre, o último palestrante a se apresentar no I Congresso de Bioética de Ribeirão Preto, em 2006, encerrou sua participação sobre Autonomia, ficou ainda mais claro o tom diferenciado que o evento teve, em comparação aos encontros científicos “tradicionais”: médicos, estudantes de medicina e outros profissionais chegavam às lágrimas, de emoção, e vários expressaram o quanto aquele evento havia sido representativo em sua vida.
“Esse foi um Congresso muito gostoso” resumiu de maneira simples, em suas considerações finais, Isac Jorge Filho, coordenador do evento e conselheiro do Cremesp (confira, aqui, entrevista completa). A manifestação não foi isolada: Emanuel, médico recém-formado de Ribeirão Preto, aproximou-se do microfone e afirmou que aqueles dias “haviam servido como divisores de água” em sua carreira e trajetória pessoal.
O estudante de Biomedicina Thiago – que não escondeu seu entusiasmo, por estar diante de “autores tão importantes da Bioética”, que conhecia apenas através de livros – foi convidado pelo conselheiro Reinaldo Ayer de Oliveira, presidente científico do Congresso, a fazer parte da Câmara Técnica Interdisciplinar de Bioética do Cremesp, “simbolizando que a Bioética estava sendo passada para as gerações mais jovens”.
Na verdade, o desfecho não poderia ser outro, após a maratona de palestras que focalizaram os aspectos éticos e humanos da relação médico/paciente; ou simplesmente entre pessoas de várias realidades. Entre outros assuntos, cerca de cento e vinte pessoas foram brindadas com palestras instigantes como “Bioética do Início da Vida”; “Terminalidade da Vida”; “Transplantes de Órgãos e Tecido” e “Bioética e Meio Ambiente”.
O clima emocionante ocorreu, ainda, por tratar-se de evento comemorativo por várias ocasiões: pelos cinqüenta anos de criação do Centro Médico de Ribeirão Preto e do Cremesp, além do dos 150 anos da cidade.
Introdução à Bioética
No dia 26 de outubro, o Congresso teve início com breve curso abordando os temas mais fundamentais da Bioética. O objetivo foi promover uma espécie de “apanhado” geral, dirigido àqueles que estão iniciando e propiciar debates que incluíram até os mais experientes.
Entre os pontos fortes do evento pode-se destacar a aula “Introdução Geral à Bioética” ministrada pelo conselheiro Reinaldo Ayer de Oliveira – que, entre outros pontos, mencionou o papel fundamental da indignação gerada pelas atrocidades promovidas durante a 2ª Guerra Mundial, na criação dos códigos de defesa da dignidade do homem, como o Código de Nuremberg; Declaração de Direitos Humanos e o Relatório Belmont.
Muito aplaudida também foi a aula sobre Ética em Pesquisa, realizada por Gabriel Oselka, coordenador do Centro de Bioética do Cremesp, que enfatizou: as experimentações antiéticas em humanos não acabaram com a Guerra contra os nazistas.
Como contou, em período recente implementaram-se experiências terríveis, como uma promovida em 1963, no Hospital Israelita de Doenças Crônicas, em Nova York, em que foram injetadas células cancerosas vivas em idosos doentes; ou pesquisa realizada até 1972 no estado americano do Alabama, em que 400 negros com sífilis foram recrutados para servirem de “cobaias” sobre a história natural da doença, tendo sido deixados sem tratamento.
Só em 1972, disse, a pesquisa foi interrompida, após denúncia no The New York Times. Restaram 74 pessoas vivas sem tratamento.
Já Isac Jorge Filho abriu sua palestra sobre os Riscos Ambientais Globais citando frase marcante do cardeal Ildefonso Schuster, arcebispo de Milão: “ Deus perdoa sempre; os homens, algumas vezes e a Natureza, nunca”.
Abertura
A solenidade de abertura do evento aconteceu a partir das 20 horas do dia 26 de outubro, contando com a participação de autoridades médicas como Desiré Carlos Callegari, presidente do Cremesp, (que proferiu palestra sobre os 50 anos da entidade, baseada no livro Cremesp, 50 anos); Welson Gasparini, médico e prefeito de Ribeirão Preto; José Luiz Gomes do Amaral, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB); Clóvis Constantino, 3º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM); Cid Célio Jayme Carvalhaes, presidente do Sindicato dos Médicos (Simesp); José Carlos Machado Curi, presidente da Associação Paulista de Medicina (APM); José Eduardo de Siqueira, presidente da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB); José Carlos Seixas, representante da Secretaria do Estado da Saúde, além de Plínio de Mendonça Uchoa, idealizador do Congresso e presidente do Centro Médico de Ribeirão Preto na época de sua fundação, em 1956.
Como palestrantes, estiveram presentes também os conselheiros do Cremesp e integrantes da Câmara Técnica Interdisciplinar de Bioética José Marques Filho – que dividiu com o bioeticista Daniel Muñoz o tema Bioética Clínica – e Caio Rosenthal, que falou sobre A Bioética na Reprodução Humana. Além deles, falaram no Congresso outros membros da Câmara Técnica Interdisciplinar de Bioética: Marcos de Almeida (Sobre a Bioética Principialista); Paulo Antônio de Carvalho Fortes (Bioética e Saúde Pública) e Trajano Sardenberg (Transplantes de Órgãos e Tecidos).
A seguir, entrevistas realizadas no Congresso e que serão disponibilizadas em nosso site:
“A visão bioética diferencia o médico bom do razoável” (Isac Jorge Filho)
Referência da Bioética nacional aborda os Limites da Autonomia (Marco Segre)
Escocês aconselha: "Os médicos devem aprender a ouvir o próprio coração"
Veja aqui um resumo do evento que trouxe ao Brasil os experts em Bioética
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