Presidente de Comissão de Ética Médica de hospital de convênio sediado em cidade do interior encaminha para análise documento intitulado “Plano de Parto”, elaborado por gestante conveniada, com muitas exigências relativas ao nascimento do filho.
Apresenta à equipe médica do hospital suas preferências relacionadas aos procedimentos do trabalho de parto, parto, atendimento ao recém-nascido e à família até a alta hospitalar, solicitando, entre outros pontos:
No trabalho de parto:
Caso seu marido não esteja presente, a presença de fisioterapeuta para exercer suporte emocional; lavagem intestinal, se seu intestino não tiver funcionado nas últimas 24 horas; permissão para ingestão de água e bebidas leves, caso sinta necessidade; adequação do ambiente, com o uso de rádio e música, que ela se compromete a levar ao hospital, bem como a regulagem da intensidade de luz no ambiente; rompimento espontâneo da bolsa das águas; analgesia/anestesia para alívio da dor ministrada apenas e quando solicitado. Além disso, tricotomia total, infusão intravenosa de modo excepcional..
Durante o parto:
Liberdade de movimentação e posição para expulsão confortável, levando em conta sua hiperlordose; uso de estribos ou perneiras apenas se necessário; episiotomia, com previa comunicação médica; analgesia/anestesia peridural ou raquidiana, a pedido materno; nascimento suave, “Parto Leboyer”; expulsão da placenta espontaneamente da parede do útero, sem manobras artificiais para esse fim.
No caso de cesárea
Ser realizada somente após início do trabalho de parto, salvo manifestação da paciente em contrário; informação clara e precisa sobre cada procedimento associado à operação; rebaixamento do protetor ou uso de espelho na hora do nascimento, permitindo que a mãe assista ao nascimento; amamentação tão logo possível, mesmo na mesa de cirurgia, ou na sala de recuperação; não usar sedativos no pós-operatório.
No pós-parto
Amamentação exclusiva, não sendo oferecidos ao recém-nascido água, leite em pó, chupetas ou bicos, exceto por exigência médica; alimentação vegetariana para a mãe; alojamento conjunto, durante 24 horas, exceto se a mãe não estiver em condições para cuidar do recém-nascido; presença do pai até a alta hospitalar.
Em resposta a todas essas exigências, em que se pese o respeito à autonomia da pessoa e as práticas em humanização, às quais muito respeitamos e defendemos, ao se internar em uma instituição de saúde, a paciente se submete aos regulamentos desta instituição, assinando termo de concordância com tais regras.
Há situações indiscutíveis, como a prevista pela Lei Estadual nº 10.241, de 1999, que e garante ao paciente o direito de “ser acompanhado, se assim o desejar, nas consultas e internações por pessoa indicada", e "ter a presença do pai nos exames pré-natais e no momento do parto". Curiosamente esta lei não determina qualquer penalidade para o não cumprimento de seus artigos.
Porém, pelo princípio da equidade, todos os pacientes internados em determinado hospital devem receber atendimento igual em direitos e deveres. Por seu lado, o médico deve acatar as normas institucionais voltadas para a segurança e aprimoramento técnico dos procedimentos.
A máxima de que o direito de cada um vai até o direito dos outros, vale no caso presente: fica impossível a certa organização de saúde receber normas de cada paciente que será internado, e cumpri-las a cada uma delas, até porque o direito de um acaba onde principia o do outro.
Usando como exemplo o solicitado pela paciente em tela, se cada internada em trabalho de parto resolvesse levar o seu aparelho de som ou rádio, isso traria vários transtornos para o serviço, seja na interferência a outras pacientes internadas, seja no relacionado às questões técnicas.
Deverá haver a previsão de pontos de eletricidade, existe o risco de sobrecarga, interferência com aparelhos médicos, altura do som, guarda dos mesmos e vários outros que podem surgir, atrapalhando na privacidade e individualidade de cada um e, eventualmente, implicando em risco aumentado para os procedimentos realizados.
Ao permitir situações que não pode controlar quando as deveria, o médico assume o risco inerente ao ato e pode ser responsabilizado, ocorrendo dano, nexo de causalidade e atitude culposa.
Enfim, ao mesmo tempo em que a autonomia do paciente deve ser respeitada, a atuação médica também deve ser pautada pela autonomia profissional, que por sua vez, responde pelo prejuízo advindo de sua prática médica e das condutas que toma por ação ou omissão.
Desta maneira, cabe ao obstetra responsável autorizar ou não quem estará presente no procedimento, inclusive, porque a responsabilidade sobre o que ocorrer durante o atendimento ao trabalho de parto e ao parto recairá diretamente sobre ele.
Em resumo, ao autorizar que cada paciente aja da maneira como lhe aprouver aceita riscos e posturas que podem vir a ser danosas para equipe medica, paciente e recém-nato.
Resposta baseada no Processo Consulta nº 139.217/12, do Cremesp
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