A questão se refere a tema recentemente abordado em portarias do Ministério da Saúde (MS): o processo transexualizador, que permite a utilização de hormonioterapia e cirurgia de mudança de sexo às pessoas com diagnóstico de transtorno de identidade de gênero (TIG) –transexuais masculinos e femininos– que desejarem.
O primeiro texto, Portaria MS/SAS nº 859/2013, pretendia ampliar o atendimento a transexuais, permitindo, inclusive, o início da hormonização aos 16 anos, com autorização dos pais do paciente, após criterioso seguimento multidisciplinar. A segunda, a MS/GM nº 1.579/2013, suspendeu a anterior, até a definição de protocolos clínicos e de atendimento, e após ouvir especialistas na matéria.
Na prática, manteve o início da terapia hormonal aos 18 anos.
Para a resposta quanto à questão, no entanto, pode-se usar parecer do Conselho Federal de Medicina (CFM), de fevereiro último (portanto, divulgado antes das portarias mencionadas), respondendo dúvida da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. No texto, o CFM pronuncia-se de forma favorável ao tratamento hormonal a garoto de 16 anos, com TIG.
“A supressão da puberdade, seguida pelo tratamento hormonal e eventual cirurgia, parecem ter inegável benefício para esses jovens” conclui o relator, com base em (amplo) levantamento bibliográfico.
Conforme afirma, os primeiros sinais de puberdade nesses pacientes costumam ser fontes de “angústia, causando forte efeito negativo social, emocional e problemas na escola”. Mesmo aqueles que se sentem bem emocionalmente “podem apresentar comportamentos opostos, como ansiedade e depressão”, ao adentrar nessa fase.
Baseado em estudos de grupos com grande experiência em disforia de gênero juvenil, como os que atuam na University Medical Center, em Amsterdam (Holanda), Gent (Bélgica), Boston, Oslo e Toronto, entre outros, traz à tona argumentos favoráveis e contrários à supressão da puberdade:
Favoráveis:
• Evita os sofrimentos que surgem a partir do aparecimento das características físicas da puberdade nos jovens com TIG, como depressão, anorexia, fobias sociais;
• Provê aos adolescentes e aos profissionais que o assistem mais tempo para avaliar a identidade de gênero, melhorando a precisão diagnóstica;
• A criança que vai permanentemente viver no papel do gênero desejado pode, assim, ser poupada do tormento do desenvolvimento completo das características sexuais secundárias opostas, indesejadas;
• O tratamento precoce evitará cirurgias mais invasivas no futuro;
• Estudos mostram resultados desfavoráveis relacionados a procedimentos tardios de mudança de sexo;
• Os jovens que não têm acesso ao tratamento regular podem tentar encontrar fontes ilícitas de medicamentos, submetendo-se a riscos à sua saúde.
Contrários:
• Alguns pesquisadores defendem que não é possível fazer um diagnóstico definitivo de TIG na adolescência;
• Outros temem que o ato de bloquear o desenvolvimento das características sexuais secundárias inibirá a formação espontânea de uma identidade consistente de gênero;
• Outros ainda afirmam que há risco potencial para o processo de crescimento e do desenvolvimento cerebral e da massa óssea.
Considerações éticas
A fim de prover consentimentos válidos, os adolescentes e pré-adolescentes devem receber todas as informações possíveis sobre tratamentos, incluindo os riscos de cada estágio terapêutico. Além de seu consentimento e da obediência da legislação, seus pais devem consentir.
Em situação de adolescentes, o princípio de in dubio abstine (em tradução livre, “em dúvida, abstenha-se”) necessite ser considerado.
Quando for julgada a conveniência da supressão hormonal da puberdade é preciso levar em conta também as possíveis consequências da não intervenção, com todos os efeitos psicossociais deletérios envolvidos.
Em resumo
Baseado na literatura científica e na legislação disponível, o parecer do CFM indica que:
Confira a legislação:
Parecer CFM nº 8/2013
Portaria MS/SAS nº 859/13
Portaria MS/GM nº 1579/13
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