19-08-2003

É errado fornecer à empresa relatório confirmando informações de paciente sobre sua vida íntima?

É antiético, ilegal e abusivo exigir "critérios" ou "requisitos" clínicos desnecessários para apuração da aptidão física ou mental de candidato à função que deva exercer e que possam dar margem à discriminação de qualquer ordem.

Durante seu questionamento, médico ginecologista contou que recebeu em seu consultório uma paciente pedindo que fosse realizado um exame de papanicolaou vaginal, a ser apresentado juntamente com outros exames, numa avaliação para seleção de candidatas ao cargo de comissária de bordo de companhia aérea.

Após uma breve anamnese, a moça apresentou um relatório a ser preenchido, a ser entregue a uma "junta de saúde" responsável por julgar se a candidata estaria apta ou não ao cargo desejado. Entre as perguntas figuravam, por exemplo, se a candidata é virgem ou se tem vida sexual ativa.

Concordamos que a norma do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional, como parte integrante do conjunto mais amplo a saúde dos trabalhadores, deveria ter prioridade na prevenção, rastreamento e diagnóstico preventivo dos aspectos de saúde relacionados ao trabalho, além da conotação da existência de doenças ocupacionais.

Entretanto, os exames necessários necessitam ser mais direcionados às condições de saúde da candidata em relação à função que irá desempenhar (por exemplo posicionamento, espaço físico, acuidade auditiva e visual, etc.), devendo, portanto, o médico emitir laudo conclusivo, compatível com o desempenho dessa função.

Deixando mais claro: o exame pré-admissional objetiva verificar precisamente a capacidade laborativa da pessoa àquele ofício que deve desempenhar, ou seja, verificar sua higidez, capacidade e inclinação para as funções que vai realizar.

Visto por este prisma, muitos dos dados inclusos na ficha ginecológica às candidatas ao cargo de aeronautas parecem abusivos, dando lugar à criação de "critérios" ou "requisitos" discriminadores para o ingresso destas mulheres ao trabalho.

"Qual é o número de filhos ou abortos anteriores", ou ainda, "se mantêm vida sexual ativa ou não" e "se usam métodos anticoncepcionais", e pior ainda, "se são ou não virgens" constituem-se em informações irrelevantes, tendo em vista o tipo de função ou de risco destas futuras funcionárias.

Sugerem ter a finalidade de desclassificar sumariamente candidatas ao emprego. Assim sendo, entendo que os médicos devem repudiar este tipo de atitude, sob pena de infração ética passível de punição.

É conveniente lembrar alguns artigos do Código de Ética Médica, como o 47, que veda "discriminar o ser humano de qualquer forma ou sob qualquer pretexto" e o 48, que veda ao médico "exercer sua autoridade de maneira a limitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a sua pessoa ou seu bem-estar".

Quanto ao segredo médico, é bom destacar o artigo 105, que proíbe que o médico revele "informações confidenciais obtidas quando do exame médico de trabalhadores, inclusive por exigência dos dirigentes de empresas ou instituições, salvo se o silêncio puser em risco a saúde dos empregados ou da comunidade".

Veja aqui a íntegra do parecer 59.336/97, do Cremesp

Esta página teve 197 acessos.

(11) 4349-9983
cbio@cremesp.org.br
Twitter twitter.com/CBioetica

Rua Frei Caneca, 1282 - Consolação - São Paulo/SP - CEP: 01307-002

CENTRAL DE ATENDIMENTO TELEFÔNICO - (11) 4349-9900 das 9h às 20h

HORÁRIO DE EXPEDIENTE - das 9h às 18h